Resenha: Sr. Holmes

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016


Por: Rodrigo Caetano

Esse é um livro um pouco mais pessoal, pelo menos para mim. Não pela história em si, ou pelo meu gosto por este ou qualquer outro trabalho do autor, mas pela personagem. Sherlock Holmes sempre foi um dos meus heróis favoritos, mesmo antes de eu saber disso.
É que, direta ou indiretamente, esse detetive mitológico inspirou diversos personagens. O famoso Dr. House, por exemplo, é um deles. Assim como grande parte dos detetives detalhistas e altamente perceptivos de filmes e séries de TV (The Mentalist, para citar ao menos uma). Foi apenas há pouco tempo que comecei a me familiarizar com as obras originais escritas por Sir Arthur Conan Doyle.
Já nesse livro em análise, vemos um retrato feito por outra pessoa do famoso detetive. Mas esse assume o seu nome e o seu papel, ao contrário dos personagens que são apenas inspirados por ele. E é isso que me motiva a escrever essa resenha, principalmente para o Blog da Liga.
Essa é uma história publicada, sim. Até virou filme, com ator famoso (Sir Ian Mckellen – O Gandalf e o Magneto) no papel principal. Mas o simples fato de ter o selo de uma editora e servir de base para um roteiro não a descaracteriza como fanfic. Vamosaela:

Título Original: A slight trick of the mind
Título Traduzido: Sr. Holmes
Editora: Intrínseca
Autor: MitchCullins

Sinopse: Aposentado há décadas, Sherlock Holmes mora numa fazenda em Sussex, onde cria abelhas com a ajuda de Roger, o filho da empregada. Além do apiário, o velho detetive gosta de passar o tempo relembrando casos memoráveis, que ele registra diligentemente em um diário. Com isso, tenta juntar os fragmentos remotos de uma de suas aventuras mais marcantes, ocorrida há mais de cinquenta anos.
Empenhado nessa empreitada, Holmes embarca em uma viagem rumo ao Japão do pós-guerra e acaba se deparando com um novo mistério: descobrir o destino do pai de seu anfitrião no país, Sr. Umezaki. Enquanto isso, na Inglaterra, Roger explora o escritório do ilustre detetive e lê avidamente seu diário, na tentativa de entender a mente e o coração de um homem tão único.
Intercalando lembranças de relacionamentos importantes que Holmes teve ao longo da vida, seus casos de amor, as amizades e um inesperado sentimento paternal, o romance de MitchCullin explora o lado humano de um Sherlock Holmes colocado diante dos surpreendentes mistérios da vida e da morte, sobre os quais ele ainda não tem a menor pista. Reflexões que, na voz de Holmes, mostram o efeito indelével que o envelhecimento exerce sobre o modo como enxergamos o mundo. 

Resenha: Esse livro é o resultado de uma empreitada ousada e corajosa. Sherlock Holmes sempre teve uma qualidade etérea, muito difícil de replicar, apesar das inúmeras tentativas de muita gente. Não se pode dizer que nunca lhe tenham feito justiça, mas há de se reconhecer que a maioria das suas representações foram, no máximo, medianas. Ainda assim, Sherlock Holmes vive no imaginário do povo, e todos tem uma ideia relativamente clara de quem ele é.
Aqui, porém, o autor explora o futuro desse personagem da cultura popular mundial em uma idade avançada, 93 anos, quando o tempo está lhe alcançando e furtando as habilidades mentais que sempre lhe foram características. Então, em essência, MitchCullins se propõe a contar uma história de Sherlock Holmes quando ele deixa de ser Sherlock Holmes.
Alguns podem considerar uma estratégia inteligente, afinal, isso lhe dá liberdade de ir além do imaginário popular, e justificar qualquer mudança com o avanço da idade, alémda clássica desculpa de todo escritor de que John Watson não lhe fazia justiça nos livros que escrevia dentro de seu universo fictício. Porém, eu acredito que seja uma desculpa para fugir da difícil missão a que o próprio autor se propôs no início do livro.
Apesar disso, o livro não peca tanto quanto algumas outras obras fizeram ao retratar Holmes. Apesar da grave, porém compreensível, omissão do conhecido gosto do personagem por cocaína, Cullins retrata um ser humano perturbado por finalmente, depois de mais de 90 anos, ser forçado a se comunicar com a sua própria humanidade, quando perde aquilo que ele achava que o definia. É um desenvolvimento psicológico bem interessante e bem construído no texto.
A estrutura da história é complexa. O livro viaja entre três períodos diferentes da vida de Holmes. O passado distante, em Londres; o passado mais próximo, no Japão; e o presente, em sua nova casa em Sussex (Inglaterra). Em cada um deles, nosso detetive é apresentado a um caso diferente. Apesar de nenhum dos casos serem tão interessantes quanto os famosos mistérios dos livros originais, eles servem bem aos seus propósitos definidos, cada um deles demonstrando o desenvolvimento do personagem.
Assim, o livro viaja no tempo de maneira intercalada, não se mantendo tempo demais e história nenhuma. E isso o prejudica, pois além de dificultar a leitura, faz com que o trabalho perca em estrutura e organização. Em um ponto importante, me peguei tendo que voltar a capítulos anteriores, para ter certeza de que não estava perdido. 
A linguagem também foi um problema. Não porque foi difícil, mas porque ao se adaptar a um estilo de história mais lento e vagaroso, com menos intensidade e mais espaço para desenvolvimento psicológico, o livro se afastou muito da linguagem clara e simples do trabalho original. Tanto que atrapalhou inclusive na identificação do personagem. Os livros de Sir. Doyle, mesmo que ficcionalmente escritos pelo Dr. John Watson, trabalham a linguagem de uma maneira esplêndida, transformando o complicado (aos olhos do narrador) em simples (aos olhos do personagem), e brincando com a o realismo e o misticismo de Holmes. Aqui, Cullins perde esse tom, em parte por tratar de temas mais delicados, e em parte por querer impor ao personagem uma voz que não combina com ele.
Contudo, a trama conseguiu me manter interessado e até me surpreendeu em alguns momentos. E cada uma das histórias que são contadas nesse livro tem uma clara representação na construção do personagem de Holmes. Ao final, é um livro interessante, mesmo que melancólico, sobre o poder da passagem do tempo e os seus efeitos mesmo nos mais icônicos homens. Não seria a melhor leitura que eu fiz esse ano, mas definitivamente não me arrependo dela. E verei o filme — afinal, eu quero muito ver o Gandalf e o Magneto como Sherlock Holmes. 

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